Todo dia é dia da consciência negra. Cantos de trabalho / memórias ancestrais.

Em destaque: Agricultoras do povoado de Caboronga, Feira de Santana, Bahia, representando a baita de feijão, uma das mais tradicionais manifestações culturais da zona rural. Foto em texto enviado por Jair Onofre ao Blog Bahia na Política, em 22/08/2016. Disponível em:

http://www.bahianapolitica.com.br/noticias/49796/grupo-da-caboronga-apresenta-bata-do-feijao-no-map.html

Momento 1 da Edição dez/2022

Cantos de trabalho – memórias ancestrais

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Documentário Cantos de Trabalho – Bahia Singular e Plural produzido pelo Instituto de Radiodifusão Educativa da Bahia (IRDEB) disponível em https://www.youtube.com/@singulareplural/videos

Foram gravados para este documentário cantos de trabalho nos municípios de Valença, Utinga, Morro do Chapéu, Araci, Santa Bárbara, Serrinha, Conceição do Coité, Amargosa e Uauá.

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Pode parecer estranho em um blog voltado para temas relacionados com a história da educação na Bahia a inserção entre os seus posts de um texto relacionado com os cantos de trabalho. A leitura do texto – provocação abaixo pode trazer os esclarecimentos necessários .

TEXTO -PROVOCAÇÃO

Trechos selecionados da introdução do artigo CANTOS DE TRABALHO DAS ROÇAS PARA A SALA DE AULA: ARRANJOS VOCAIS E INSTRUMENTAIS de autoria de Cristina Maria Carvalho Nascimento 1

Falar sobre os Cantos de Trabalho, Samba de Roda, ou quaisquer elementos culturais de tradição oral, nos traz a ideia de “memória”, a memória que lembra e esquece. Santana (2017) comenta que memória e esquecimento são elementos indissociáveis.[…]

Quando falamos de Bahia, a cultura de tradição oral tem pouca força e, consequentemente, é posta à margem do esquecimento. Esquecimento imposto pelos motivos da escravidão, do sofrimento aos escravos e de seus descendentes. A música da Bahia tem sua força, mas de que música falamos? Este artigo pretende abordar os Cantos de Trabalho, sobre a sua ausência nos currículos da escola pública como elemento de reconhecimento cultural, bem como da sua importância como conteúdo curricular em música. 

Dessa maneira, tendo a minha história docente como referência, resolvi escrever arranjos instrumentais e vocais dos Cantos de Trabalho para serem incluídos no currículo do Centro Estadual de Educação Profissional em Música, local onde trabalho. A proposta, já posta em prática e com resultado significativo observado no aprendizado dos alunos, foi transformada em material didático – pedagógico em forma de um caderno de arranjos, no qual o aluno pode optar por tocar só ou em conjunto.                                                       

Há 25 anos eu ouvi da grande musicóloga baiana, professora Lídia Hortélio, com quem tive o prazer de trabalhar no Colégio Estadual Deputado Manoel Novais, primeira escola estadual com a formação técnica em Música da Bahia, a seguinte frase: “Devemos ouvir o mundo e cantar o Brasil”. […]. Durante quinze anos, fui professora de violão e tive a sorte de ter tido excelentes alunos. Seguindo o pensamento da querida professora, ouvimos o mundo e cantamos o Brasil e daqui de onde falo, já vendo com olhos maduros, cantamos muito do Brasil que já conhecemos, o chorinho, o “jazz”, a bossa nova, o Brasil da superfície e não o Brasil das entranhas, isto é, aquele que não está na mídia e nas gravações. 

Não cantamos a Bahia que a professora Lídia tanto falava, da comunidade da Grota Funda de Serrinha, mesorregião do Nordeste Baiano, do Reisado, das Cantigas de Roda. O tempo passou. […].

[…].

[…]. Por essa reflexão, e depois de ouvir muito a música da roça na voz da minha mãe e de Dona Di2 , — que veio de Monte Gordo para minha casa na década de 70 — é que compreendi a importância de trazer os cantos populares para dentro da sala de aula.

  Os cantos nunca saíram de minha vida e durante os anos de Magistério, sempre senti que eles precisavam ser trazidos para as pessoas da cidade. Hoje, portanto, como professora e gestora de uma escola de Música, escolhi fazer um recorte musical e, dessa forma, proporcionar ao aluno do ensino médio do Centro Estadual de Educação Profissional em Música a oportunidade de conhecer um pouco sua raiz cultural, ressignificando a sua identidade musical através do estudo dos Cantos de Trabalho da região de Feira de Santana, sistematizando-os em metodologias teóricas e práticas.

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1 Artigo apresentado ao Programa de Pós-graduação em Artes – PROFARTES – Instituto de Humanidades e Artes IHAC. Universidade Federal da Bahia, como requisito para obtenção do grau de Mestre em Artes. Durante a pesquisa que resultou na elaboração do artigo a autora inseriu os cantos no processo educativo do Curso Técnico de Instrumento Musical, no CEEP em Música e elaborou um planejamento interdisciplinar com as disciplinas de Português, de História e de Geografia.

2 Dona Di ou Dona Agnalda, nascida e criada em Monte Gordo, Camaçari.

Veja o artigo na íntegra acessando os links https://www.udesc.br/arquivos/ceart/id_cpmenu/11673/ARTIGO___CRISTINA_MARIA_16237115082715_11673.pdf ARTIGO___CRISTINA_MARIA

Elementos para uma melhor compreensão das colocações da autora do texto- provocação

O que são cantos de trabalho?

Cantos de trabalho são conjuntos de canções realizadas a capela (sem acompanhamento instrumental), de maneira coral ( todos cantando junto) ou responsorial (solista ou solistas respondido pelo grupo) com o objetivo de anunciar, organizar, incentivar ou aliviar o trablho coletivo. São considerados os mais antigos cantos da humanidade, junto aos cantos religiosos.

( Fred Dantas no texto Cantos de Trabalho no Projeto Sonora Brasil. Disponível em: https://rfp.sesc.com.br/moodle/mod/resource/view.php?id=1297 )

Os Cantos de Trabalho, no Brasil, são o resultado do entrelace das tradições musicais indígenas, europeias e africanas e remontam ao tempo dos escravos. Para cada trabalho existe uma cantiga e para o fim do trabalho, a celebração com o samba. É o canto simples do povo, suas histórias comuns, histórias de amor, cantos religiosos, lamentos. São muitas as formas musicais que, reunidas, são chamadas Cantos de Trabalho e todas servem a um único fim: o de trazer mais conforto ao trabalho exaustivo do homem do campo, de forma coletiva ou individual.

( Cristina Maria Carvalho Nascimento no artigo Cantos de trabalho das roças para a sala de aula: Arranjos vocais e instrumentais. Disponível em https://www.udesc.br/arquivos/ceart/id_cpmenu/11673/ARTIGO___CRISTINA_MARIA_16237115082715_11673.pdf )

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Há no Brasil grande variedade de cantos de trabalho, remontando a maioria ao período colonial, quando a mão-de-obra escrava foi amplamente empregada na lavoura, na mineração e na cidade. Hoje, parte considerável desses cantos se encontra extinta, dado o processo de modernização.Também outras cantigas, por terem cadência apropriada são utilizadas nos cantos de trabalho: as tiranas por exemplo, cantadas pelos canoeiros e barqueiros da Bahia.

Alguns cantos de trabalho: 1) O canto-dos-carregadores-de-piano; 2) O aboio; 3) Os vissungos; 4) O cantar elogio ou cantar ao desafio, observados em Pernambuco em fins do século passado;5) A peja, realizada pelos trabalhadores de engenho, era a festa que comemorava o término dos trabalhos de moagem da safra colhida; 6) Os pregões;  7) Cantigas de mendigos ou cantos de pedintes; 8) Os acalantos.

Fonte: Enciclopédia da Música Brasileira. disponível em https://dancasfolcloricas.blogspot.com/2011/04/cantos-de-trabalho.html

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Mais vídeos com cantos de trabalho

Cacau (1976) Documentário filmado por Leon Hirszman na região de Itabuna, Bahia, que recolheu cantos e danças dos trabalhadores das roças de cacau, praticados nas atividades de extração e “pisa” da fruta

Entre 1974 e 1976, Leon Hirszman realizou três documentários produzidos pelo MEC sobre os cantos entoados pelos trabalhadores rurais nordestinos. Na trilogia há a documentação dos cantos de trabalho da cana-de-açúcar em Feira de Santana, dos plantadores de cacau em Itabuna, de mutirões em Chã Preta.

 O filme Cantos de Trabalho, de 1955, é um dos curtas-metragens da série Brasilianas, dirigida por Humberto Mauro no Instituto Nacional de Cinema Educativo (Ince) entre 1945 e 1956. Disponível em:

Conteúdos Culturais http://www.bcc.org.br/filmes/443389 e em rochajose Duca Rocha https://www.youtube.com/@rochajoseducarocha9082

SEMENTE DE MANDIOCA

Letra da Cantiga das descascadeiras de mandioca da comunidade de Barreiras, em Barrocas – BA, em CD da Cia Cabelo de Maria. Produção: Selo SESC.

Tem uma semente de mandioca

Que aqui ninguém tem dela

E vai, cai fora

Na minha roda

Mandioca não rela

Eu vou ralar,

Eu vou ralar,

Eu vou ralar

Mandioca

Eu vou ralar

SEMENTE DE MANDIOCA

Cantiga das descascadeiras de mandioca da comunidade de Barreiras em Barrocas (BA). Interpretada por Ceumar, Renata Mattar e Lucilene Silva, acompanhadas por Felipe Dias (violino) e Gustavo Finkler (viola caipira). Disponível em https://www.youtube.com/@SerraAzul

Membros da Companhia Cabelo de Maria . Entre eles Renata Mattar, cantora e pesquisadora que pesquisa o tema faz vários anos e durante suas viagens registrou os Cantos de Trabalho

Foto no texto Cantos de Trabalho publicado no Brasil Atual sob a responsabiliade da Redação da RBA em 04/04/2013. Disponível em: https://www.redebrasilatual.com.br/revistas/cantos-do-trabalho/ . Acesso em 13/12/2022. 

Dois cantos de trabalho recolhidos na Bahia

Faixas do CD “Cantos de Trabalho” do grupo Cia. Cabelo de Maria.

1.É no balanço da peneira Cantiga da farinhada da comunidade de São Nicolau em Santa Bárbara, Bahia ;

2. Que tem Maria? Cantiga da Baita de feijão da Fazenda São José, Serrinha, Bahia.

As cantigas apresentadas no disco “Cantos de Trabalho”, lançado em dezembro de 2007 pelo selo SESC São Paulo, vêm das destaladeiras de fumo de Arapiraca (AL), das descascadeiras de mandioca de Porto Real do Colégio (AL), das plantadeiras de arroz de Propriá (SE), da farinhada da comunidade de Barrocas (BA), da colheita de cacau de Xique-Xique (BA), da bata do feijão de Serrinha (BA) e das fiandeiras de algodão do Vale do Jequitinhonha (MG).

Renata Mattar e Gustavo Finkler fundaram o grupo Cia. Cabelo de Maria no ano de 2007 com a proposta de compartilhar a pesquisa musical feita por Renata em seus mais de 10 anos de viagens pelo Brasil registrando músicas da tradição popular.

Vissungos (cantos de trabalho)

Vídeo aula e performance sobre os vissungos (cantos de trabalho) no Brasil.”, com Graciela Soares veiculado no Cultura Abraça Campinas (https://www.youtube.com/@CulturaAbracaCampinas)

Para saber mais:

1. Sonoros ofícios : cantos de trabalho : circuito 2015/2016. – Rio de Janeiro : SescDepartamentoNacional2015.

2. O campo, os cantos de trabalho e a resistência de autoria de Joana Monteleone publicada em Brasil de fato em 15 de maio de 2020.

3. MARIO DE ANDRADE Música brasileira

4. Calendário Negro 2023

5 CANTOS DE TRABALHO POR THALLES GOMES C COSTA

6. Cantos de trabalho resistem em comunidades do sertão na Bahia… Leia mais em https://www.cartacapital.com.br/cultura/cantos-de-trabalho-resistem-em-comunidades-do-sertao-na-bahia/.

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