Os problemas da escola do tempo da selfie na Bahia

Em destaque: Alunos da Escola Parque realizando atividades de depósito e recebimento no Banco criado na escola para fins de aprendizagem. Cartaz localizado no IBGE, disponível em:

https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/fotografias/GEBIS%20-%20RJ/BA12468.jpg

Um adendo:

A decisão por adotar o título MODOS DE FAZER EDUCAÇÃO NA BAHIA – no passado e no presente impõe ao Blog registrar e discutir, quando possível, os problemas da escola nos tempos da selfie. A partir da edição de maio/2023, vamos passar a incluir nas postagens temas relacionados com as questões que a escola enfrenta na Bahia, atualmente, tentando articulações com o observado no passado.

SOBRE O PASSADO DISTANTE E O PASSADO PRÓXIMO (2020-2022)

No momento em que a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou que a covid-19 não configura mais emergência em saúde pública de importância internacional é essencial discutir os problemas criados pela pandemia em relação à aprendizagem das crianças e jovens .

Textos de pesquisadoras do GPEC fazem referências aos impactos que as epidemias e pandemias na educação e na escola, no passado e entre 2020 -2022.

Tiane Melo dos Anjos discutiu em Educação e Sociedade: o passado e o presente na vivência de pandemias, primeiro texto provocação apresentado no Blog, em outubro de 2020, os reflexos na aprendizagem e na escola da pandemia de Covid-19 e, também, apresentou questões que estiveram presentes em epidemias que devastaram o nosso estado no pasado.

Segundo Tiane,

Além da necessidade do acolhimento psicológico, da busca ativa dos estudantes e do desenvolvimento de práticas educativas diferenciadas, o pós-Covid colocou em questão as estruturas físicas e higiênicas das nossas escolas. A maioria possui instalações precárias, com salas de aula com pouca ventilação e iluminação, espaços onde amontoam-se quarenta a cinquenta alunos, a falta de água é um dos problemas presentes em muitas escolas da zona rural e das cidades da região metropolitana da Bahia

Enfim, temos escolas insalubres que não possuem critérios mínimos, tais como: a ventilação cruzada, janelas e portas grandes para facilitar a entrada da luz. Características estas que nos levam a pensar sobre as condições físicas e higiênicas dos prédios escolares do passado e do presente. Segundo Conceição (2012) data de 1853 a primeira prescrição sobre a higiene escolar por meio de tratados que versavam sobre o funcionamento higiênico, asseios, localização, disposição e divisões do prédio escolar.

[…]

Cabe salientar que estas orientações de outrora tinham por objetivo diminuir o potencial de disseminação de moléstias e epidemias nas escolas. Mais de um século depois com a explosão da pandemia de Covid-19 estamos, novamente, tomando como discussão os prédios escolares e os protocolos de retorno as atividades.

Em estudo sobre os avanços e retrocessos no ensino primário municipal, em Salvador, no período de 1896-1927, Soeiro e Santana, também pesquisadoras do GPEC, registraram:

Além de reduzir o montante de recursos aplicados no ensino, a peste impunha a colocação em prática de medidas de saneamento que resultavam no afastamento das crianças da escola produzindo desequilíbrio nas estatísticas de freqüência.  Há registros sobre a varíola e a peste bubônica, em 1904.  Antônio Bahia relata que ” o fato anormal da peste bubônica deu logar à medida acauteladora do fechamento das escolas urbanas da capital, primeiro parcialmente, depois geralmente, resultando d’ahi serem suspensos também os semestraes a que se procedia, recomeçando depois da abertura das escolas.[…] A quem responsabilizar?”

Também a prohibição de receber-se nas escolas municipaes quem não apresentasse attestado de vacinação anti-pestosa esvaziou as escolas, de sorte que as classes reduziram consideravelmente o número de discípulos(1905, p. 191).

No mesmo ano, o Delegado Escolar Presciliano Leal escreve em seu relatório :

Debalde falamos ás creanças […]; debalde os senhores professores pediam aos paes de seus alumnos que os sujeitassem  a vaccinação; debalde foi a  propaganda humanitária da imprensa diária desta capital concitando o povo a prevenir-se  immunisando-se  contra a peste negra do Levante “ […] porque a maioria da população, como se estivesse toda combinada para uma greve resoluta e definitiva, despovoara quasi todas as escolas, não sujeitando os meninos á vaccinação reclamada pelo poder público.”  (LEAL, 1905, p. 209)

Ao denunciar que as escolas ficaram desertas, e algumas mesmo vazias, Presciliano exemplifica relatando a situação de várias escolas, entre elas a da rua do Passo [Paço]  que tinha uma freqüência média de  55 alunos, até o dia 16 de julho de 1904, e passou a  ter apenas 12 por serem as únicas que apresentaram os referidos atestados.

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O texto de Tiane Melo dos Anjos está disponível em https://modosdefazer.org/trocando-ideias/

O texto de Soeiro e Santana com o título de Progressos e retrocessos da escolarização obrigatória na escola primária do Município de Salvador  entre 1896-1927 integra o livro O ensino primário no município de Salvador 1896 -1929, volume III da obra A Construção da Escola Primária na Bahia que está disponível na Biblioteca Central do Estado da Bahia, na Biblioteca da Faculdade de Educação da UFBA e em outras bibliotecas

Como o governo estadual e municipal baianos estão tratando os problemas de ensino e de aprendizagem decorrentes da pandemia de Covid -19 ?

É a pergunta que cabe fazer no primeiro semestre do ano letivo de 2023.

Contribuindo para a reflexão ou busca de informações sobre o que está sendo realizado em nossas escolas, trazemos o texto Cómo recuperar el aprendizaje perdido por la pandemia de autoria de RICARDO PINEDA publicado em El PAÍS, no dia 26 de abril de 2023.

Leia abaixo o texto traduzido para o português.

Como recuperar a aprendizagem perdida pela pandemia


Projeto para Melhorar a Qualidade da Educação-Banco Mundial e MINED, El Salvador. Foto: Banco Mundial.OSCAR LEIVA MARINERO (FOTO: OSCAR LEIVA MARINERO / SIM)

RICARDO PINEDA

(Disponível em https://elpais.com/america/termometro-social/2023-04-26/como-recuperar-el-aprendizaje-perdido-por-la-pandemia.html . Acesso em maio 2023)

Junto com a histórica redução de 4,3% do Produto Interno Bruto (PIB) mundial em 2020, um dos alarmantes estragos provocados pela pandemia ―e cujas consequências de longo prazo apenas começam a se tornar visíveis― é a lacuna educacional, que teve um impacto mais perceptível em regiões que já apresentavam problemas socioeconômicos e políticos anteriores, como é o caso da América Latina e Caribe.

Os especialistas preveem várias consequências que podem ultrapassar a esfera do desenvolvimento cognitivo e pessoal em diferentes níveis para a vida adulta futura dos alunos que estudaram períodos de ensino a distância. “Os alunos de hoje podem perder em média até 12% de sua renda futura, decorrente do atraso educacional causado pela Covid-19. O défice cognitivo em crianças pequenas pode mesmo representar uma perda de 25% do seu rendimento quando forem adultos”, de acordo com os estudos realizados sobre o impacto da pandemia no capital humano.

Do ponto de vista global, entre março de 2020 e março de 2022, um aluno médio perdeu quase um ano de educação presencial devido ao fechamento de escolas, cenário ainda mais desfavorável para a América Latina e o Caribe. Enquanto isso, o fechamento prolongado de escolas na região se traduziria em uma média de 1,5 ano de aprendizado perdido.

A isto deve-se acrescentar o fato de que, em toda a região, as taxas de matrícula e conclusão tendem a ser ainda mais baixas entre os homens do que entre as mulheres no ensino superior, especialmente nas populações rurais e socioeconomicamente desfavorecidas, onde têm menos probabilidade de frequentar a escola e nas quais o abandono é explicado por uma ativação precoce da vida profissional. E é provável que essas taxas tenham sido ainda mais reduzidas pelo efeito da pandemia.

contornar a adversidade

No estudo intitulado Dois anos depois. Salvando uma geração , elaborado pelo Banco Mundial e pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), em colaboração com a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), aponta quatro medidas essenciais para recuperar o aprendizado no curto prazo:

– Colocar a recuperação educacional no topo da agenda pública.

– Reintegrar todos os meninos e meninas que abandonaram a escola e garantir que permaneçam nela.

– Recuperar aprendizagens e garantir o bem-estar socioemocional de meninos e meninas.

– Avaliar, apoiar e formar professores.

Por sua vez, a agenda de aprendizagem de recuperação deve priorizar habilidades fundamentais em leitura e matemática, avaliar o nível de aprendizagem e implementar estratégias e programas de aprendizagem de recuperação em larga escala.

Essas quatro medidas também faziam parte de uma declaração regional para proteger e restaurar o aprendizado , lançada em 2 de junho de 2022 com o apoio de quatro presidentes da região.

recuperar aprendizado

Felizmente, nesta história os esforços e exemplos de trabalho conjunto para mudar realidades não param. A iniciativa Um compromisso de ação foi lançado recentemente com vários governos latino-americanos em um evento regional na Colômbia , com o objetivo de garantir a aprendizagem básica de meninos e meninas, um esforço que se soma à declaração regional para proteger e recuperar a aprendizagem. As boas práticas de recuperação educacional que muitos países já vêm implementando também foram compartilhadas no evento.

Diante desse esforço conjunto, Emanuela Di Gropello, especialista em educação do Banco Mundial, argumenta que a pandemia e seus efeitos também podem representar um momento ideal para criar um novo espaço, onde a educação na região não apenas se recupere, mas também se fortaleça.

Nessa perspectiva, talvez quatro desafios possam ser destacados para acelerar o aprendizado no futuro:

1. Melhorar a prontidão para aprender. Promover competências básicas de leitura, escrita e matemática antes da escolaridade formal, com o objetivo de aumentar a qualidade do desenvolvimento na educação inicial.

2. Revisar o currículo para reforçar as habilidades de alfabetização. Habilidades fundamentais devem continuar a ser priorizadas também na educação formal. Além disso, desde a pré-escola até as primeiras séries do ensino fundamental, a chamada ciência da leitura desacreditou alguns métodos que foram usados ​​por anos e ainda são usados ​​para ensinar a ler. Por exemplo, rever a leitura global e modificá-la é essencial para erradicar a pobreza de aprendizagem a longo prazo.

3. Melhorar a qualidade e eficácia dos professores. Fornecer ferramentas que promovam a aprendizagem para que os alunos alcancem todo o seu potencial. Planos de aula estruturados e com roteiro são recomendados, bem como livros didáticos e recursos educacionais para aprimorar a instrução.

4. Reorientar a gestão escolar para o desenvolvimento de competências básicas. Alguns aspectos que podem orientar a reorientação da gestão escolar para a aprendizagem são: fornecer suporte técnico à equipe gestora da escola; implementar sistemas individualizados de acompanhamento e avaliação formativa; fornecer recursos básicos para programas eficazes de ensino e treinamento e permitir alguma flexibilidade na escola e no nível do distrito para focar no aprendizado.

Di Gropello é enfático no fato de que a América Latina pode aproveitar essas oportunidades, que se complementam para construir sistemas educacionais melhores do que antes.

O nivelamento da aprendizagem é um desafio urgente, embora complexo e multifatorial, alcançável. Além da revisão de programas, competências e técnicas, a implementação de medidas governamentais, planos e estratégias educacionais, bem como uma formação de professores muito mais adequada e focada, é necessário um acompanhamento permanente da saúde e do bem-estar psicossocial dos envolvidos para ser capaz de alcançá-lo de forma eficaz; com efeito imediato e visão de longo prazo.

Mais informação

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CECÍLIA MARTINEZ GOMEZ

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